segunda-feira, 7 de abril de 2014

Rosa Maria V

Gracinha entrando pela porta da nossa capela foi uma das coisas mais lindas que já vi. Ela parecia um anjo com cauda que pairava no ar com um largo sorriso e uma meiguice adorável. Ao lado dela o Lilo. Estranho não ver meu pai carregando aquela menina para o altar. Acho que seria o dia mais feliz da vida dele. Ia estufar o peito como pombo e dizer: "É minha filha, e vai ser boa mãe de família". Orgulho bobo de antigamente. Também ele tinha mais é que comemorar mesmo. De mim nunca teria essa alegria. 

A noiva. Até perfume de rosas ela usou neste dia. Usou um brinco que era da nossa mãe, emoldurou seu rosto com uma trança em seus cabelos e se fez rainha pelo véu de sete metros. Minha pequena. 
Eu nunca entendi. Confesso. Mas naquele momento a Graça me fez chorar. Ela refletia nas suas pequenas pérolas cada raio de sol lá de fora. Tudo nela era tal qual poesia. 

Então Lilo olhou para ela, ela olhou para ele e começaram a caminhada sem volta. Mãos dadas, tão apertadas que se via o desenho de cada veia e o suor que os unia. Estava nervosa. Lilo ainda mais, afinal era o homem da casa e quem tinha a tarefa de garantir um bom futuro a nossa irmã.

Andaram ao som de um sabiá laranjeira que se postou na janela a cantar. Dizem que esse pássaro canta o amor. Vai ver era sinal de prosperidade. Ou era só mais um dia normal para ele. 

Chegando perto de Nazareno, Lilo soltou dedo a dedo a mão de Gracinha e se concentrou em apertar ainda mais forte a mão daquele homem. Um risco de olhar os colocou em acordo. Acordo silencioso, que nada precisa se dizer. Um passo em falso e Nazareno viria abaixo. Era assim que as coisas funcionavam.

Os noivos se ladearam e o Padre começou com todo apelo moral pelos bons costumes. Da promessa de união, fidelidade, na saúde e na doença, na alegria e na tristeza. Pensei eu que se fosse comigo nunca aceitaria cada vírgula do discurso. Mas Gracinha achou tudo muito bonito. Garanto que Nazareno deve ter rido por dentro. Casar com uma moça intocada era grandeza, sinal de homem respeitável. E ele? Era tão inocente como a Graça? Não. 


Casados. 

Todos iriam para a casa que Nazareno havia herdado de seu avô para um almoço. Mesa farta e bebida a vontade. Logo os machos daquelas redondezas iriam colocar suas garras de fora enquanto suas Senhoras conversavam sentadas sobre suas anáguas. Conversas bobas, de mulher que nasceu pra esquentar o umbigo na boca da panela de ferro e furar os dedos costurando botão na camisa do marido.

Me retirei. Já havia cumprido meu último compromisso familiar. 

Logo eu ia me embora de vez. Ia ganhar o mundo. 
E eu já sabia exatamente como.


2 comentários:

  1. Precisa publicar um livro!!! essas editoras estão perdendo best sellers!

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  2. amaaaada!!!!! espera que tem muita confusão na vida desta louca!

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